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A falta que faz o contato humano

Ambos os pais vieram da roça. Depois do casamento, mudaram-se para São Paulo. A pequena Adriana viveu praticamente toda a sua vida no extremo sul da cidade, próximo ao Grajaú. Hoje, mulher feita, aos 37 anos, estuda moda na Belas Artes e costura. Na mistura da família, é possível ver em seu rosto a descendência, tanto europeia quanto indígena, principalmente pelos olhos.

 

Pra quem a conhece, sabe que pode contar com ela pra boas risadas, mas também pra uma boa briga. Seja qual for o tópico, ela com certeza dá sua opinião e se embasa em pesquisas feitas por ela mesma. Em suas páginas profissionais no Facebook, está sempre disposta a dar informação aos entusiastas do Gótico, estilo que gosta e segue desde a adolescência, lá pros anos 90.

 

Apesar de estar de volta ao Grajaú, já morou no Rio de Janeiro e no Bom Retiro, bairro sobre o qual sabe bastante. Conhece desde lojistas até barraquinhas de comida. Manja bem d’aquelas ruas e construções antigas.

 

A diferença da infância dela pra de hoje é muita, afirma. Também pudera, tudo mudou. As comunicações, as distâncias físicas, a maneira de se relacionar com o mundo. Estamos longe e perto de tudo e todos ao mesmo tempo, podemos, com aquela história batida, nos comunicar em tempo real com alguém do outro lado do planeta, não precisamos mais esperar meses para que uma carta chegue. Os penpals agora são mais numerosos, mais fáceis de alcançar. Porém, Adriana, ou Ana, como a maioria a conhece, considera a carta muito mais pessoal. Talvez pela paciência que se deve ter ao espera-la, ou como escolher o que dizer, já que era preciso resumir um grande tempo num mesmo envelope.

 

Mas com essa facilidade de comunicação, veio também um enorme “gap” entre os próximos. Paramos de conversar com quem está, literalmente, ao nosso lado, em carne e osso.Isso é principalmente notável em uma cidade como São Paulo. A metrópole já foi coberta por praças onde as pessoas se reuniam, era possível ver as pessoas conversando na calçada ao fim da tarde. Hoje, só vemos pessoas reunidas nas praças virtuais.

 

Ana relembra que, naquela São Paulo pré-internet e telefonia móvel, havia ainda aquele costume de se reunir em família, em amigos, de ter aquele contato físico real, de olhar nos olhos e não fitar a tela, de sentir o toque quente de uma mão humana e não o frio, mesmo que figurativamente, de um aparelho que, ao encurtar, aumenta as distâncias reais.

 

Como ela mesma diz, “é bom ter essa facilidade, mas às vezes, o contato pessoal faz falta”.

 

E como faz. A cada dia que passa, São Paulo, e o mundo, ficam maiores e menores. É o paradoxo da época digital, da modernidade, do progresso vigente. É mais fácil viajar a outro país, porém muito mais difícil sustentar um olhar, uma conversa no elevador, ou mesmo deixar os amigos de longe para sair com os de perto. Parafraseando uma música, atualmente, nossos sonhos são digitais. E nossas vidas também.

Texto: Magdalena Bertola

Fotos: Magdalena Bertola e arquivo pessoal de Adriana Rodrigues

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